A apuração de fatos, em suas várias formas e denominações (sindicâncias, inquéritos, processos, etc.), como concebemos, evoluiu da ideia de substituir nos seres humanos o desejo de fazer justiça com as próprias mãos. Nos
primórdios, sob a desculpa de estar “vingando” uma imaginada agressão
sofrida pelo filho, o patriarca matava todos os entes da família do suposto
agressor. Uma das primeiras tentativas para limitar a reação veio na inspiração
religiosa do “olho por olho…”.
Reflita-se: apenas olho por olho, não mais! E todo o “mais” seria
excesso, tão abominável quanto o ato reprovado.
Pelos naturais inconvenientes, a civilização retirou do particular a possibilidade da “vingança privada”, com a contrapartida de substituí-la por um
sistema público. Os povos estabeleceram regras (condutas intoleráveis e de
que forma são instituídas) especializando pessoas para tratarem disto (quem
acusa, defende ou julga e como se executam ordens, etc.).
Assim, nasceram as autoridades públicas com competência específica e
aparatos para investigar, fiscalizar cumprimento das normas e deflagrar processos (troca da vingança pela prudência). Instituiu-se correlato direito de
defesa dos acusados, que aos poucos foi ganhando amplitude. Para coroar a
obra, julgador imparcial, independente, criteriosamente escolhido e com liberdade legal para decidir. Reside mais ou menos neste tosco, resumido e atropelado raciocínio, todo o sonho da humanidade em atingir um ideal de justiça.
Nesse quadro, somos advogados brasileiros e nosso dever legal é defender destinatários desses procedimentos (cidadãos), tentando impedir desvirtuamentos que possam conduzir a irreparáveis prejuízos e erros judiciários.
Para podermos cumprir esse dever sagrado, a Constituição Federal em seu
artigo 133 nos aponta como: “…invioláveis e indispensáveis à administração
da justiça…”, e a Lei Federal nº 8.906/94, enuncia que em nosso “ministério
privado prestamos serviço público e exercemos função social”, equiparando-nos com a magistratura e Ministério Público: “não há hierarquia nem
subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público,
devendo-se todos consideração e respeito recíprocos”.
Ainda, o Código Penal considera “crime contra a administração da
justiça” em seu artigo 355: “trair, na qualidade de advogado ou procurador, o
dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio em juízo, lhe é
confiado” com pena de até três anos de detenção e possibilidade também de
perda do direito de advogar. Sem advogado e real exercício de defesa, o
processo é nulo.
Ou cumprimos fielmente nosso dever ou cometemos crime! Setores
inscientes estão ferindo a picaretas (“picareteando”) um dos insubstituíveis
pilares do templo da Justiça, atentando contra tais conquistas da civilização,
com negativos reflexos para os direitos individuais. Recordemo-nos de que uma
das gritas contra o AI-5 era a “supressão ou limitação do direito de defesa”.
Corretas assim as decisões recentes do STF quando anulam procedimentos por cerceamentos de defesa. O Judiciário não tem compromisso com
o erro! Sem esta garantia estarão desgraçadas as demais instituições!
Escrita em 18/08/2005